23.7.08

Crónica de um homem objectivo

(Para ler nas férias)

Enquanto escrevo, a campainha toca desalmadamente. É a minha futura ex-mulher, também ela sem alma alguma… Parou. Deve ter desistido. Não para de me incomodar. Às vezes penso que o juiz é que tem razão e eu devia mesmo devolver-lhe a casa.
Não sei bem porque isto acabou assim. Eu até gostava dela. Ela era perfeita para mim. Acho que no fundo, o problema, é que eu nunca acreditei na perfeição. E depois ela sempre foi uma mulher muito fria e não lhe vi melhoras nenhumas com esta história do aquecimento global.
Tive várias namoradas antes dela, mas só casei com esta. Se soubesse o que sei hoje, tinha-me casado com todas. Até porque o divórcio é o fim ideal para qualquer casamento. Muito melhor do que a morte porque pelo menos continuamos vivos.
Divorciei-me dela porque já não estava a dar. Ela queria ter filhos e eu tive de lhe explicar que as pessoas para terem filhos precisam de ter condições para os ter. Ela insistiu que nós tínhamos condições para pelo menos dois filhos. E eu perguntei-lhe: “Então porque é que havemos de estragar essas condições?…” Mas fiquei com a ideia que ela não me percebeu.
Chateámo-nos de vez por causa da TV. Para as mulheres, as duas melhores invenções de sempre, foram a televisão – a maior rede de calhandrice do mundo – e o televisor 16:9 porque é “lindo”. Especialmente, com a imagem 4:3 esticada a toda a largura. À grande! Nunca, nada aumentou tanto a auto-estima das telespectadoras. Todas as gajas da TV ficaram de repente tão gordas quanto a minha mulher passou a achar que é normal ser. Mas eu, ao contrário de toda a gente que eu conheço, gosto de ver a televisão com algum sentido de proporção. Detesto que a televisão se torne desproporcional. Para isso já bastam os programas e as notícias.
Verdade seja dita, quem a engordou fui eu. Sou eu, quem cozinha cá em casa. Hoje em dia, gosto de cozinhar. Aprendi a cozinhar por causa dela. Ela era meio anoréctica quando casámos. Um dia fartei-me da “salada de poucochinho” e fui à cozinha e disse-lhe: “Miúda, eu cozinho aqui, tu cuzinho, mas no quarto.” Ela só concordou com a primeira parte do acordo e até começou a gostar dos meus cozinhados. A porca no primeiro mês, engordou 20 quilos! O que não era difícil, porque quando começámos a namorar ela não pesava mais de trinta quilos, mamas incluídas. Eu, menos de trinta não toco. Ou está para morrer ou é pedofilia e prefiro não arriscar.
Hoje em dia, até acho mal que os homens mandem as mulheres para a cozinha e se ponham na sala a ver televisão e a beber cerveja. Desde logo porque a cerveja fresca está na cozinha! Lá também há televisão e depois, as mulheres hoje em dia, já não sabem cozinhar! No fundo, já não há mulheres como antigamente. Quer dizer, haver há, só que estão velhas…
Por isso mesmo acho que as mulheres deviam sair da cozinha. Os homens deviam, pelo menos, deixá-las ir à sala de vez em quando. E deviam levá-las à rua. Nem que seja para fazer as necessidades, que elas estão sempre aflitas quando saem… Tenho um vizinho que leva o cão à rua todos os dias e a mulher apenas uma vez por semana. Parecendo que não, isso não faz muito sentido.
Olha! Lá está ela a tocar… Está na rua a tocar porque eu mudei as fechaduras todas…
Tive de acabar com ela. Ela engordou de mais. Parecia o Fernando Mendes… Ainda a tentei vender por um preço certo, mas ninguém me quis ficar com ela.
Ainda me lembro quando a vi pela primeira vez. Gostei logo dela. Conheci-a numa esquina. Literalmente, é verdade. Mas eu nunca acreditei que ela andasse a atacar. Ela, não. Lembro-me que tinha sempre um grande decote e muitos homens de volta dela. É engraçado... As mulheres saem à rua de decote pelo umbigo para o mostrar a um homem e passam o resto do dia a aturar todos os outros…
Ela tinha umas mamas grandes e lindíssimas que se comportavam de forma estranha: estavam sempre a olhar para mim. Como a maioria dos homens, casei com ela por causa das mamas. Os homens desconfiam muito das mamas. E é por isso que fazem questão de as trazer sempre debaixo de olho.
A princípio correu tudo bem. Gostávamos um do outro e o que eu tinha era dela e o que ela tinha era meu… Excepto o cu, não por eu não lho ter pedido, mas porque ela tinha mau feitio. A partir daí tivemos muitos problemas… Perguntei-lhe uma vez: “Mas tu tens algum problema com o meu pénis?” E ela, que não. E eu voltei à carga: “Então se não te dás mal com o meu pénis, porque é que nunca o beijas antes de ir dormir?” Mas acho que ela não percebeu…
Começámo-nos a afastar cada vez mais e eu sugeri que déssemos uma volta ao nosso casamento. A meu pedido considerámos a hipótese de alargar os nossos horizontes sexuais e um dia houve mesmo a hipótese de fazermos uma ménage com uma amiga dela. Estava tudo combinado quando ela desistiu e disse que era melhor tentarmos resolver o nosso problema de outra forma. E eu disse-lhe: “Oh querida, eu compreendo perfeitamente que tu não queiras fazer uma ménage com a tua amiga. Só não percebo porque é que eu não posso.”
Pouco depois começou a acusar-me que eu nunca abri a boca para lhe dizer que ela era a minha amada. Mas eu também nunca a vi abrir a boca para me fazer uma mamada!... E sabem que mais? Ela não percebeu…
Um dia rebentou. Ela disse-me que eu não valia um caralho.
Nas unidades de medida, não valer um chavo é muito mau. Não valer um peido, é péssimo. Mas não valer um caralho, é fatal. Larguei-a logo ali. Tive sorte porque logo ali era a casa dos pais dela. Voltei para casa e nunca mais a deixei entrar.
Olha! Está a tocar outra vez… E desta vez já subiu as escadas. Alguém lhe abriu a porta de baixo. Tenho de parar de teclar que ela pode ouvir. Vou teclar baixinho…
Entretanto, deixei de me dar com ela. Faço questão de só me dar com pessoas que me conseguem aturar. Eu sei bem que lhe fiz trinta por uma linha… Depois, mudei de linha e lixei-me… Fiquei-lhe na palma da mão… E ela aplaudiu-me.
Desde então, passei um mau bocado… Estava muito habituado a ela. Nunca mais encontrei nenhuma mulher com quem tivesse uma ligação espiritual assim. Uma mulher que tanto me lia Fernando Pessoa, como discutia sobre a civilização, como sabia exactamente onde estava a minha roupa interior suja. Mesmo a que estava debaixo do sofá da sala. E só mo dizia se eu lho perguntasse. Ela era diferente. Depois dela fiz mesmo uma travessia no deserto… Confesso que me pus à procura de uma gaja boa. Uma mulher bonita. Mas para não me sentir fútil, decidi que queria uma mulher bonita mas inteligente. E depois para tornar a coisa mais interessante: Uma mulher bonita, inteligente e loira. Não é que eu não queira assumir um compromisso, mas isso há-de existir. Ou não?
Um homem sabe que não dá uma queca há muito tempo quando os preservativos de bolso passam de validade. Quando dei por mim, tinha o caixote do lixo cheio e a cama às moscas. Como é fácil de imaginar, não existe maneira nenhuma de bater à punheta que não tenha sido já inventada ao longo destes milénios de existência de homens com pénis. A coisa torna-se monótona a partir da nongentésima quadragésima primeira ou segunda vez. E entra na rotina.
Foi então, que conheci a Vera.

A Vera era muito boa rapariga. E muito saudável. Uma saúde!… Para imaginarem, ela era tão saudável que até a merda dela tinha aloé vera e cheirava àquilo e tudo. A Vera era quase tudo o que eu quero de uma mulher: ela era bonita, era loira e acima de tudo era muito inteligente. Sobretudo, inteligente a comer. É que ela era ovo-elástico-vegetariana. Isto é, só comia vegetais, ovos e pastilha-elástica.
Conheci a Vera num bar… Disse-lhe: “Ó Vera eu também acho que os D’ZRT são extraordinários… Olha lá, queres ir lá a casa ver a minha colecção de CD’s? Hum?… Depois, se não gostares vestes-te e vens-te embora…” E ela lá foi. Mas não pensem que isto é assim sem mais nem menos. Porque no fundo, nós homens, para termos sexo, precisamos assim, de algo especial, digamos, um sítio. Enquanto as mulheres precisam sempre de uma boa desculpa. A Vera chegou a minha casa e queria mesmo ver a porcaria da colecção dos CD’s. E nessa altura eu já tinha vendido os CD’s quase todos da minha mulher… Passei tudo para Mp3, claro.
Conversa para aqui, conversa para ali e passados cerca de alguns dois minutos comecei a tentar despi-la. Mas ela disse que não. Não? Parece que não estava preparada. Que não costuma estar assim com alguém em apenas 45 minutos depois de a conhecer. E eu pensei: “será que precisa de mais uns minutos?!” Eu sei que um homem às vezes tem alguns problemas com o tempo. Eu tenho problemas com o tempo. Mas nestas coisas sou uma pessoa objectiva, não vejo qual é o problema. Que sorte a minha! De entre tantas adolescentes hiper-mega-liberais, eu apanhei a mais pudica delas todas.
Então disse-lhe que na verdade gostava muito dela e expliquei-lhe que só costumava ir para a cama com uma mulher, assim no mínimo, dois meses depois de a conhecer. Mas expliquei-lhe que ela, ela era muito especial e que eu nunca tinha sentido aquilo com alguém antes. Confesso que nunca tinha visto uma mulher a despir-se tão depressa. Mas logo depois, no momento da verdade, lá voltou ela ao não! …
Não, outra vez? Parece que não estava preparada e que não se sentia à vontade sozinha comigo. E eu perguntei-lhe: “Mas então queres o quê, chamar uma amiga?” E ela disse que sim, que com uma amiga seria melhor.
Já agora que falo disto, outra vez, deixem-me desmistificar aqui uma coisa. Dizem que o sonho de qualquer homem é fazer amor com duas mulheres ao mesmo tempo. Não é verdade. Isso pode ser verdade para alguns homens, mas para a maioria não é assim. Duas é o mínimo. Sempre é mais que uma, mas está muito longe de ser o ideal. Como apesar de tudo, nós homens somos humanos, até conseguimos viver só com uma, desde que não haja outra hipótese viável.
Perguntei-lhe: “Mas queres uma amiga porquê?” Só lhe fiz a pergunta porque não havia ali nenhuma e ainda ia levar algum tempo até encontrarmos uma. Porque senão, tinha perguntado depois. Foi então que ela me explicou que era lésbica!
A princípio fiquei um pouco sentido. Afinal de contas depois de estarmos ali os dois, na intimidade um do outro, completamente nus, adiantadamente enrolados, agora é que ela mudava de orientação sexual? Pensei que não estivesse a gostar do que via. Se calhar, podia ser uma desmotivação de tamanho. Expliquei-lhe que o tamanho não era tudo e falei-lhe da importância da grossura, bem como do empreendedorismo da coisa. Aliás, das coisas em geral. Mas ela explicou-me que era mesmo lésbica e que nunca tinha estado com um homem. O que para mim não era mau – assim pelo menos não tinha termo de comparação.
Por essa altura eu já estava louco e já dizia qualquer coisa. Em desespero de causa, usei a técnica mais arriscada. Fui sincero, falei-lhe francamente e abri o peito – disse-lhe que a amava do fundo do coração. E fizemos amor loucamente. Foram os melhores 7 segundos e 12 centésimos da minha vida. Garanto-vos. Há quem diga que é ejaculação precoce, eu chamo-lhe objectividade!
Ainda nos voltamos a ver mais uma ou duas vezes. Nessa noite. Ela nunca concordou que chamássemos a tal amiga. Mais tarde (ou logo de manhã, não me lembro) voltou a ser lésbica. Nunca percebi muito bem porquê.
Porque é que ela nunca quis chamar outra?…
Olha! Lá está a outra a tocar. Chiu! Vou desligar o computador e a música para ver se ela se vai embora…

4 comentários:

flôr de sal disse...

desculpa lá Grande, tive de ler o texto todo hoje, é que este ano não tenho férias...

MJLF disse...

Ó Grande, isto está de partir o côco a rir!
Maria João

Peter disse...

Vais de férias?
Isto é para nos manteres entretidos?

Abraço :)

Anónimo disse...

muito bom seu texto...muito bom mesmo!!!