23.12.08

Natal Tristão

Jornalista: E como é habitual temos connosco Mauro Tristão, o nosso pessimista de serviço para o comentário semanal. Não sei se quer destacar a boa notícia da semana que passou?...
Mauro Tristão: Para mim todas as notícias são más.

J: Compreendo, mas de certeza que das diversas notícias há-de haver uma positiva. Vejamos… O não do parlamento europeu às 65 horas de trabalho, parece-me a melhor notícia da semana…
MT: A si e a toda a gente.

J: Mas o problema é?...
MT: Não há problema nenhum. Era uma estupidez aumentar o horário de trabalho. A Europa está pobre, estamos à beira da recessão, da falência e do desaparecimento e como sabe, nunca foi a trabalhar que alguém ficou rico.

J: Está a ironizar?
MT: Não tenho a certeza.

J: Bom fiquemos assim, talvez possamos mudar de assunto. Por exemplo, a condecoração de Manoel de Oliveira…
MT: Isso é que não. Já não aguento falar desse homem. É como um emplastro que nunca mais morre. Anda sempre a fazer o último filme há mais de trinta anos. Ele não merecia uma condecoração, merecia era uma certidão de óbito.

J: Mas mesmo não gostando dos filmes de Oliveira…
MT: Quem é que lhe disse que não gosto? Gosto e muito, dos bons obviamente, porque ele faz alguns filmes que nem o mais reles principiante desse antro a que chamam Escola de Cinema conseguia fazer. Às vezes pergunto-me se ele ainda vê e sobretudo se ouve. Uma coisa é certa, a cinematografia de Oliveira sofre nitidamente de Alzheimer.

J: (Cof! Glup!) Bom, mudemos de assunto. Tentemos por exemplo os sapatos contra Bush…
MT: Ora aí está uma excelente notícia.

J. A sério?
MT: Desta vez é a sério. Repare que o facto de aquele jornalista iraquiano mandar os seus sapatos contra Bush, revela toda a situação do Iraque. Por um lado, mostra que o Iraque já é um país livre. Pelo menos para atirar sapatos ao Bush. Repare que até na América, apesar de quererem muito, nunca ninguém tinha tido coragem para o fazer. Depois, o jornalista não conseguiu acertar. O que demonstra que ainda assim, é cedo para retirar as tropas americanas. Os iraquianos ainda precisam de tempo para afinar a pontaria. Acho que Bush deveria visitar o Iraque novamente daqui as uns meses…

J: Ok. Não o vou maçar com mais assuntos. Teremos oportunidade de voltar a alguns deles em próximas semanas. Mas vou terminar com algo que, imagino, não deve gostar muito: o Natal!
MT: Como é seu apanágio, está enganado. Gosto muito do Natal.

J: Isso não deixa de ser surpreendente…
MT: É das minha épocas favoritas.

J: Mas o que é que o faz gostar do Natal, é o espírito natalício?…
MT: Obviamente que não. O espírito natalício é todos os anos esfaqueado até à morte dentro de catedrais do consumo. A coisa mais abjecta da nossa civilização continua a ser a obscenidade da entrega de prendas a crianças ranhosas que se babam em cima de brinquedos que só vão ver nessa noite ao rasgar o papel de embrulho.

J: Mas este ano segundo os dados que temos, os portugueses estão a gastar menos...
MT: Estou muito contente por saber que esta gentinha toda este ano está tão miserável que finalmente deixaram-se de consumismos exacerbados. Pena é que continuem a comprar aquelas bugigangas chinesas asquerosas que ao fim de um tempo perdem a tinta ou ganham gordura nos cantos e tornam-se apenas bibelots de lixo e bactérias. Mas as pessoas sempre gostaram de viver no meio da porcaria…

J: Mas o que é que gosta no Natal?
MT: O que eu gosto mesmo, é da noite de Natal…

J: Ah! A reunião da família?...
MT: Se você tivesse uma família como a minha, onde entre outras alimárias se contam três alcoólicos, duas velhas neuróticas, uma tia perigosamente psicótica, um irmão esquizofrénico – o melhorzinho, de resto – e outro que é um perigoso homicida, percebia porque é que eu passo o Natal sozinho, muito obrigado.

J: Estou a ver…
MT: Não está, nem imagina. Mas posso dizer-lhe que guardo muitas boas memórias da noite de Natal.

J: Ah! Então junta-se com amigos em volta do bacalhau...
MT: Não seja palerma. Gosto do natal porque é a altura que anda toda a gente entretida com compras, fechadas em centros comerciais e assim não me chateiam. Até porque à distância, adoro ver pessoas desesperadas a correr de um lado para o outro como baratas tontas alternando entre a raiva pelas outras pessoas que os atrasam e o espírito natalício que é suposto terem. Muito perto do sindroma bipolar, maníaco-depressivo como um dos meus primos…

J: Então e o que faz na noite da consoada?
MT: É a altura ideal para passear pelas ruas, sozinho. Não se vê vivalma, não há ninguém para me chatear, não há palermas como você, de andar apressado ou a buzinar, rua abaixo, rua acima. É o paraíso.

J: Parece-me um pouco frio para passear...
MT: Em Porto Alegre, no Brasil? Não. Nesta altura do ano está sempre calor. Vou sempre no dia 23 e só volto no dia 5 de Janeiro.

J: Quer dizer que parte hoje?
MT: Exacto.

J: Bom Natal para si, Mauro Tristão.
MT: Curiosamente, a Natal não vou. Mas Bom Natal para si.

J: E Bom Natal também para aqueles que nos seguem. Até para a semana com o comentário de Mauro Tristão em directo do Brasil…
MT. "Em directo"... Você nem no Natal pára com as aldrabices…

1 comentário:

rff disse...

Natal Português/Tristão:

http://hipocrisiasindigenas.blogspot.com/2008/12/um-natal-portugus.html

Saúde,